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Crítica | Burial: “Antidawn”

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Quem ansiava por um novo registro de inéditas de Burial, com suas quebras rítmicas, micro-ambientações e batidas pouco usuais, talvez acabe se decepcionando com o material entregue em Antidawn (2022, Hyperdub). Mais recente criação do misterioso William Bevan, o trabalho de cinco faixas preserva uma série de elementos que fizeram do produtor britânico um dos nomes mais influentes das últimas duas décadas, porém, utiliza por uma abordagem bastante singular. Do uso ruidoso e submerso das vozes à parcial ausência de componentes rítmicos, Bevan apresenta ao público uma obra totalmente imersiva.

A exemplo do que havia testado em outros registros ainda recentes, como Subtemple / Beachfires (2017) e Chemz / Dolphin (2021), Burial entrega ao público um repertório essencialmente enxuto, porém, abrangente. São texturas e ambientações sobrepostas que ganham forma em uma medida própria de tempo, sempre acompanhadas pelo som enevoado de sintetizadores discretos. Do som de um isqueiro sendo aceso, passando pela inserção de passos, ruídos metálicos e sirenes, cada mínimo fragmento do trabalho parece pensado de forma a envolver o ouvinte, transportado para dentro desse ambiente soturno.

Não por acaso, parte expressiva das canções se resolve em um intervalo de mais de oito minutos de duração. Livre da urgência explícita no cultuado Untrue (2007), de onde vieram músicas como Archangel e Ghost Hardware, Bevan investe em um repertório propositadamente arrastado e labiríntico, como se pensado para ser desvendado pelo ouvinte. E isso fica bastante evidente em Strange Neighbourhood. Feita para ser absorvida aos poucos, sem pressa, a faixa que exige uma audição atenta se revela ao público em pequenas doses. São ruídos, ambientações e fragmentos de vozes que encolhem e crescem a todo instante.

E isso se reflete com naturalidade até a derradeira Upstairs Flat. É como se Bevan costurasse diferentes retalhos dentro de cada composição, conceito que tem sido aprimorado desde obras como Truant / Rough Sleeper (2012) e Rival Dealer (2013), mas que ganha novo significado nas canções de Antidawn. De fato, difícil não pensar no registro como um bloco único. É como se cada música servisse de passagem para a faixa seguinte, estrutura que vai do tratamento dado aos vocais ao uso de ambientações enevoadas, como uma interpretação totalmente desacelerada e ainda mais misteriosa dos antigos trabalhos do produtor.

Embora consistente, Antidawn invariavelmente soa como uma obra incompleta. Para além do minucioso jogo de batidas que apresentaram o trabalho de Burial no início dos anos 2000, o registro de cinco faixas peca pela completa ausência de ritmo e forte similaridade entre as faixas. Não é difícil se perder durante a execução do material, efeito direto do abandono entre possíveis divisas conceituais que separam uma composição e outra. São canções que ensaiam momentos de maior euforia, como em New Love, mas que regressam de maneira decidida ao mesmo território criativo apresentado em Strange Neighbourhood.

O que difere Antidawn de outros exemplares do gênero, talvez desinteressantes pela morosidade excessiva e forte homogeneidade entre as faixas, está na capacidade de Bevan em trabalhar pequenos acréscimos que continuam a ecoar na cabeça do ouvinte mesmo após a execução do material. São vozes cíclicas, ruídos e inserções urbanas que se repetem de forma a estimular um curioso senso de familiaridade. Canções que incorporam traços dos antigos registros apresentados do produtor, porém, de forma sempre atmosférica, como um respiro breve em uma produção historicamente marcada pela fluidez dos elementos.

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